Logo após a emblemática decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que equiparou a união homoafetiva à união estável, em 5 de maio, o casal formado pelo tradutor Lula Ramires, 51, e pelo analista de suporte, Guilherme Amaral Nunes, 25, foi até o cartório de Cerqueira César, zona oeste de São Paulo, para tentar converter a recém-conquistada união estável em casamento civil. Como de praxe, inclusive entre casais heterossexuais, o pedido foi encaminhado a um juiz. Mas ele negou a conversão nesta semana.
Para Ramires, a decisão da juíza Renata Mota Maciel, 2ª Vara de Registros Públicos da capital, é reflexo de uma postura historicamente conservadora do judiciário paulista.“O argumento da juíza é que a conversão não está prevista em lei e que união estável gay é diferente de casamento”, diz. “Ela agiu pela letra da lei, mas se o Código Civil fala uma coisa, o Supremo diz outra. Seria muita sorte conseguir a conversão aqui em São Paulo, onde o judiciário é muito conservador, tradicionalista”, afirma.
O casal está estudando a melhor estratégia para recorrer. Ramires acredita que o Tribunal de Justiça de São Paulo derrube a decisão da juíza. “Se chegar no STF, eles serão favoráveis a nós, mas acredito que o próprio TJ derrube a decisão. Eles sabem que nos tribunais superiores a interpretação é outra”, diz.
Impasse
Segundo o artigo 226 da Constituição Federal, a lei deve facilitar a conversão da união estável em casamento. Além de garantir uma série de direitos não previstos na união estável, o casamento civil reconhece o casal como entidade familiar.
Ramires afirma, aliás, que o pedido de conversão foi feito a partir de uma demanda concreta: ele e o companheiro estão adquirindo um imóvel e gostariam que a escritura contenha o nome de ambos como casal, e não como sócios. “Do ponto de vista simbólico tem um peso muito grande. A gente quer que a sociedade nos veja como família”, afirma.
A decisão do Supremo não dispõe claramente sobre a conversão em casamento, embora a maioria dos ministros tenha deixado isso claro em seus votos. O acórdão com as minúcias da decisão do STF, que pode acabar com as dúvidas quanto à interpretação da conversão da união estável em casamento, deve ser publicado dentro de dois meses.
Caso o texto do acórdão não aborde a conversão, caberá aos juízes e tribunais interpretar a lei e a decisão do Supremo, até que o impasse chegue ao STF. Para os movimentos gay, o ideal seria ter o Congresso aprovar uma lei garantindo o casamento homossexual.
O advogado Julian Rodrigues, do grupo Corsa, que defende a causa gay, diz que dezenas de casais entraram com pedidos de conversão desde a decisão do Supremo. Até agora, a única decisão foi a de São Paulo. Caso o acórdão do STF não trate da conversão, a ideia dos ativistas é promover um mutirão de recursos nos tribunais até que consigam uma decisão favorável.
“Durante 15 anos apresentamos recursos para o reconhecimento da união homoafetiva. Agora, se for preciso, vamos fazer o mesmo para ter o direito ao casamento”, afirma.
A assessoria de imprensa do TJ-SP informou que a juíza Renata Mota Maciel está em férias e não pode comentar sobre o caso, já que o processo corre em segredo de Justiça.