A data foi instituída oficialmente pela Lei nº 12.519, de 10 de novembro de 2011 e faz referência a Zumbi dos Palmares, então líder do Quilombo dos Palmares, personagem histórico e símbolo da luta e resistência dos negros escravizados no Brasil, o qual foi morto por bandeirantes liderados por Domingos Jorge Velho.
Para além de relembrar a luta dos negros contra a opressão, a data é também uma excelente oportunidade para refletir, debater e sensibilizar sobre essa grave violação dos direitos humanos.
Por mais que melhorias e avanços tenham acontecido, o cenário ainda é muito preocupante, pois a falta de oportunidade para a população negra e as práticas de desigualdade e racismo estrutural evidenciam que ainda temos um longo caminho a percorrer.
Alguns indicativos podem nos ajudar a compreender esse problema de ordem social e o maior deles tem profundas raízes na construção da história de nosso país e das heranças deixadas pela tradição de nossos colonizadores, cuja cultura permanece arraigada nos costumes da sociedade contemporânea.
Segundo levantamento e pesquisa realizada após as eleições de 2018, somente 4% dos políticos eleitos para o legislativo àquela época se autodeclararam negros.
A mesma pesquisa aponta que cerca de 56% da população autodeclara-se negra, entre os mais ricos, e os negros representam somente 18,8% nesse seguimento. Em contrapartida, os negros (pretos e pardos) representam 75% dos mais pobres e 65% dos recolhidos em penitenciária no Brasil.
Vale também ressaltar que, no mercado de trabalho, os negros também sofrem o preconceito, pois recebem em média, mil e duzentos reais a menos do que os trabalhadores brancos e representam 60% da população desempregada.
A cultura religiosa oriunda de negros africanos, as chamadas religiões de matriz dos povos de terreiros (umbanda e candomblé), historicamente sofreram preconceito e eram até 1930 proibidas no Brasil.
Em que pese a Constituição Federal de 1988 prevê a liberdade religiosa, o que se vê em nosso país é uma certa resistência e até mesmo ações de vandalismo contra os terreiros de cultura africana que praticam encontros dessa religião.
Quando Procurador-Geral de Justiça, em alusão ao dia da consciência negra, no ano de 2019, através da ESMP, promovemos no Centro Cultural do Ministério Público, uma série de debates republicanos e rodas de conversas onde foram debatidas alternativas de resistência a essa chaga social que é o racismo.
Na oportunidade, também foi realizado um sararau poético da identidade negra com apresentações de música, poesia, desfile de moda e exposição de artesanato para demonstrar o apreço que a instituição tem pela arte e cultura afro-brasileira.
Dentre as mais variadas medidas adotadas, à época, podemos ainda destacar a inclusão como meta e prioridade do planejamento estratégico, a fiscalização no cumprimento da Lei 10.639/03 que fez incluir na Lei de Diretrizes de Base – LDB, a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira como forma de reparação aos danos sofridos pela população negra ao longo de sua história.
Outra ação importante de iniciativa do Ministério Público e da Fundação Josué Montello, com apoio da Vale do Rio Doce, foi o lançamento da cartilha com o passo a passo para legalização e registro das associações de apoio às casas religiosas de matriz africana, que visava promover o reconhecimento e valorização daquelas comunidades tradicionais, enquanto territórios de vivência comunitária da área Itaqui Bacanga.
Lembro-me como se fosse hoje quando recebi no meu gabinete a visita da Procuradora de Justiça Sandra Elouf, então Coordenadora do CAOP de Direitos Humanos que se fazia acompanhar das colegas Promotoras de Justiça Samira Mercês e Lana Pessoa, também integrantes do Centro de Apoio, as quais com bastante entusiasmo e amor a causa lideraram a campanha, transformando-a num importante projeto institucional que favorece a construção de um caminho virtuoso de respeito as diversidades religiosas no Maranhão.
Vi com alegria que o tema de redação do ENEM deste ano foi “Desafios para valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil”, fazendo com que os alunos e a sociedade possam pensar numa proposta de intervenção que valorize os direitos humanos e a importância de se preservar a cultura, reverteendo as opressões sofridas por esses povos desde o nascimento colonial do nosso país.
Que este dia da consciência negra seja um momento de reflexão acerca desse racismo estrutural inconsequente e seja um convite as nos posicionar por mudanças na busca da constituição de um país mais justo, fraterno e inclusivo.