São João inspirador
- CARLA MELO/ DO ALTERNATIVO/ JORNAL O ESTADO DO MARANHÃO
“Todo mundo canta sua terra/ eu também vou cantar a minha/ modéstia à parte seu moço, minha terra é uma belezinha”. Os versos de João do Vale, imortalizados na canção “Todos cantam sua terra”, dão uma mostra do que passa pela cabeça de artistas maranhenses que se inspiram, ora nas belezas naturais, ora na cultura diversa do estado para compor suas obras. E o período junino é sempre terreno fértil para compositores, artistas plásticos e coreógrafos também exaltarem suas raízes.
Que a cidade se transforma nesta época do ano, isso quem mora aqui sabe bem. São as cores, os cheiros e os sons que impregnam o ambiente, transformando São Luís em um grande terreiro por onde passam as principais manifestações da cultura popular, fonte de inspiração para o cantor e compositor Josias Sobrinho.
Um dos que bebem diretamente na fonte destas manifestações, Sobrinho traz em suas letras e linhas melódicas a presença dos sotaques do bumba meu boi, quadrilha, lelê e outras sonoridades. Ele conta que esta aproximação é uma das características de seu trabalho. “Quando comecei a compor, morando em Belo Horizonte, neste mesmo período vi artistas da Bahia, Ceará, Minas Gerais falando sobre suas identidades, bem como aquele momento político. Já queria fazer algo que remetesse à minha terra também e quando voltei, me deparei com a proposta do Laborarte que era a de fazer a cultura popular do Maranhão dialogar com o mundo”, diz Josias Sobrinho. O autor de “Catirina” relembra que na infância, passada no interior de Cajari (MA), manteve contato com a figura dos cantadores de boi “cronistas de sua gente”, pessoas de relevância na comunidade. “Eu queria fazer aquilo e me dediquei a pesquisar elementos para fazer a minha música”, disse. E o resultado foram composições como “Engenho de Flores” e “Rosa Maria”, entre outras.
Para Josias Sobrinho, o título de artista regional está longe de o incomodar. “Percebo com tristeza o distanciamento desta geração com as coisas daqui, mas acredito que quem canta sua tribo, canta o mundo”, opina Sobrinho. Com propriedade para compor, Sobrinho fala a partir de suas experiências, talvez por isto mesmo tenha alcançado ecos fora do Maranhão e do Brasil, já que tem músicas de sua autoria gravadas na Europa, a exemplo de “Dente de ouro”, imortalizada na voz de Papete.
O bumba meu boi e as manifestações juninas também estão presentes nas obras de nomes como Zeca Baleiro, que gravou no primeiro disco da carreira a toada “Essas emoções”, de Donato Alves. Alcione também já gravou músicas que exaltam a cultura popular do Maranhão.
Mas se engana quem acha que são só os maranhenses que integram este rol. A baiana Maria Bethânia gravou “Bela Mocidade”, de Donato Alves e Francisco Naiva, e “A coroa”, de Humberto de Maracanã.
Imagens – “Se eu não fosse fotógrafo seria músico porque tenho fascínio pelos sons das manifestações populares”, revela Márcio Vasconcelos, que tem boa parte de seu trabalho voltado para a documentação de manifestações como bumba meu boi e tambor de crioula. Há décadas ele percorre comunidades de São Luís e também do interior do Maranhão em busca de um novo olhar sobre essas culturas. Para o fotógrafo, as semelhanças entre algumas comunidades maranhenses com a África é algo que chama a atenção.
Outro aspecto destacado por Vasconcelos é a sensibilidade para registrar os detalhes. “Quanto mais você mergulha, mais se pode encontrar, mais se pode aprender. Sair do geral e entrar nos detalhes é um mergulho que rende grandes ensaios, que extrapola em muito aquele ‘São João para turista ver’”, sentencia Vasconcelos. Para o fotógrafo, tanto apreciadores como produtores de arte que vivem no Maranhão não conseguem passar incólumes à força da cultura popular. “Vamos sempre ter esta influência de uma cultura que é diversa, que vem impregnada da herança negra e de uma força que é vivível em pessoas que se entregam mostrando que de fato é algo herdado”, comenta.
Dança – No Maranhão, a música quase sempre vem acompanhada pela dança. E é a partir desta constatação que a coreógrafa Olinda Saul costuma montar espetáculos e coreografias, a exemplo da montagem “Rosa Maria, festa de tambor”, que uniu uma bailarina clássica e um dançarino popular em coreografias. Além deste, Olinda Saul assinou a coreografia “Bela mocidade”, que foi apresentada em concursos de dança, entre os quais o Festival Internacional de Dança do Mercosul. “O balé clássico tem como herança as danças populares e nunca descarto a possibilidade desta junção que sempre traz resultados muito bons”, diz Olinda Saul.