Há algum tempo gostaria de compartilhar com o público uma percepção que tenho observado no campo da gestão pública de nossa terra relacionada ao poder Judiciário e os Órgãos de preservação de nossa memória histórica e arquitetônica. Trata-se da relação que envolve o prédio do Fórum Eleitoral construídos nos últimos 12 anos na Areinha, próximo à Fábrica Cânhamo e em frente ao espaço da Passarela do Samba.
Pois bem, lembro-me como se fosse hoje que aquela construção não agradava a direção local do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), pois fora uma medida tomada sem sua aprovação, além disso, ouvi reclamações de integrantes daquele Órgão de que tal construção iria ser um ruído visual junto ao conjunto arquitetônico daquele sítio residencial e histórico de nossa capital. Embora tal obra fosse de jurisprudência do Estado, no que se refere ao controle e uso daquela área.
Nas minhas percepções verifiquei que a construção de um prédio moderno naquela área irá mexer com a volumetria da paisagem naturalizada ao longo do tempo e o próprio valor históricos das construções ali instaladas, como a Fábrica Cânhamo, a Fonte do Bispo, Casarões de Azulejos em ruínas localizados ao lado da antiga Indústria Martins (fabricava sabão), entre outros monumentos de menor porte, mas de importância inquestionável para o centro histórico de São Luís.
Independente de minhas preocupações de curioso e investigador cultural, eu constatei que a referida edificação foi realizada e concluída com todo o rigor arquitetônico, tendo o referido Fórum Eleitoral sido transferido para aquele local com uma estrutura moderna, mobiliada com o que havia de melhor e mais moderno no mercado local, portanto algo de dar inveja nos outros equipamentos que atendiam o poder judiciário maranhense, incluindo ainda uma sinalização primorosa, ar condicionado perfeito e acessibilidade em todas as instalações, atendendo o público de maneira confortável e segura.
Foi lá que fiz minha biometria para atender a nova orientação da legislação eleitoral, que se orgulhava em anunciar que a votação em cédulas de papel iria ficar para o passado, pois a modernização do processo eleitoral maranhense estava a entrar em uma nova era: a votação digital. Fator que daria aos futuros pleitos eletivos a segurança e rapidez na apuração dos mesmos com toda a garantia possível.
Pois bem, o referido equipamento com menos de dez anos de utilização – talvez cinco ou seis anos – teve que ser transferido para outro local. Apresentaram uma desculpa esfarrapada de que havia problemas estruturais e o referido prédio poderia cair. Nunca engoli essa explicação, pois me lembro daquele Parecer contrário de técnicos do nosso IPHAN, que sempre foi rigoroso com o trato da salvaguarda e preservação do patrimônio histórico e arquitetônico de São Luís.
Eu mesmo, como gestor de um equipamento vinculado a Universidade Federal do Maranhão, já fui acionado na Justiça por ação do IPHAN por ter mandado construir uma estrutura de madeira (provisória) de palco, no pátio do Palacete Gentil Braga, para atender as atividades desenvolvidas pelo Departamento de Assuntos Culturais da Pró-reitora de Extensão e Assuntos Estudantis daquela Instituição de Ensino Superior. Ali desenvolvemos dezenas de projetos que atendiam à comunidade acadêmica e ao público em geral com uma repercussão muito favorável, então pensava o óbvio: “ninguém joga pedra em fruta podre”, por isso, eu achava que estava a fazer uma atividade saudável para nossa comunidade. Puro engano meu – a Lei é cega e não aceita (ou não deveria aceitar) desvios de conduta.
Ai eu fico imaginando, por que mandar derrubar um prédio moderno, feio (segundo meu gosto) e agressor arquitetonicamente em uma área totalmente de interesse histórico? Afinal, ali foram gastos milhões de recursos públicos e ocupava uma área destinada ao lazer público, mas de grande importância estratégica para a visibilidade e proximidade do centro da cidade.
Só para exemplificar, lembro-me de uma reivindicação que há vários anos, a classe produtora dos desfiles de carnaval de nossa terra tenta tirar dos gestores políticos o compromisso de que ali seja construída a “Passarela Samba” definitiva naquela área e o poder público sempre alegou que ali não é permitida a construção edificada de volume grandioso e moderno como a sede do Fórum Eleitoral, objeto desta minha crônica aqui referenciada.
Uma das investidas da classe cultural na tentativa de atendimento da demanda de ser construída a “Passarela do Samba” foi quando o carnavalesco Joãosinho Trinta ganhou seu último campeonato no Carnaval Carioca (1997), com a Escola de Samba Viradouro: Ele veio a São Luís e os nossos militantes apresentaram uma maquete de “Passarela do Samba” para a ex-governadora do Estado, Roseana Sarney, que não acolheu a reivindicação e usou como álibi essa desculpa esfarrapada: – “Não podemos construir a Passarela naquele local, pois o Patrimônio Histórico não permite”. E os nossos carnavalescos ficaram mais uma vez com cara de tacho, inclusive eu.
Agora quase que diariamente eu passo pelo Anel Viário e vejo aquela cena dantesca, escabrosa e triste: – “as ruínas de um prédio sendo demolida vagarosamente pelo tempo e nada dele desabar, mas a impressão que fica é a de que a Justiça determinou a sua destruição por incongruência administrativa e arquitetônica com o sítio histórico de São Luís… e para não ficar feio para a própria Justiça junto a comunidade, o verdadeiro motivo fora ocultado, então temos a desculpa de inadequação estrutural da obra, que ameaçava ruir. Pois bem, vamos fazer de conta que acreditamos, pelo menos não se trata totalmente de uma notícia “fake”.
Considerando que o estrago já foi feito e o Estado gastou milhões de recursos financeiros que fora jogado do pelo ralo, então, essa não seria uma ótima oportunidade de aproveitar a hora e derrubar de vez aquela estrutura escabrosa e urbanizar a área dignamente para utilização como espaço público? Pessoalmente eu acho uma excelente ideia, só falta a gestão pública de nossa terra querer e a nossa comunidade exigir essa readequação. Pense nisso. Continuamos atravessando esse período de Pandemia Covid 19.
São Luís, 26.06.2020.
Euclides Moreira Neto – Professor Mestre em Comunicação Social e Investigador Cultural.