16/04/2025

Etarismo no samba? Vila Isabel e Mangueira causam polêmica após limite de idade em inscrições para desfile de 2025

As escolas de samba Estação Primeira de Mangueira e Unidos de Vila Isabel estão no centro de uma polêmica após anunciarem limites de idade para o cadastramento de integrantes nas alas para o desfile de 2025. A decisão, que muitos consideram como uma forma de etarismo, resultou em repercussão e críticas nas redes sociais.

Nesta quarta-feira, a Mangueira anunciou que a faixa etária para a composição das alas seria de até 60 anos, sem justificar o motivo da limitação. Já a Vila Isabel, que fará o cadastramento neste sábado, estabeleceu um limite entre 18 e 50 anos para as alas especiais, justificando que essas fantasias exigem movimentação.

‘Agressão ao passado’

O termo “etarismo” se refere à discriminação com base na idade, especialmente contra pessoas mais velhas, e foi rapidamente associado à decisão das escolas. Em entrevista ao GLOBO, o escritor Alberto Mussa, cujo livro “Meu destino é ser onça” foi tema do samba-enredo da Grande Rio este ano, aderiu às críticas.

— Não vejo motivo para limitar a idade dos participantes. A questão não deveria ser a idade, mas sim se a pessoa tem condições físicas para participar. Não vejo lógica nesse impedimento. Parece que as escolas estão priorizando o espetáculo, talvez acreditando que a presença de pessoas mais velhas impacte visualmente o público — destacou.

O escritor ressaltou que as mudanças parecem ser movidas por questões econômicas e de espetáculo, mas criticou a falta de uma explicação clara, considerando a decisão “extremamente deselegante”.

— Para eles, encher as alas de jovens traz uma beleza que agrada aos olhos — disse ele.

Mussa também destacou a importância dos baluartes, figuras históricas e simbólicas das escolas de samba, que sempre desempenharam um papel central na manutenção das tradições. Segundo ele, a exclusão dos mais velhos pode ferir a ideia de ancestralidade, essencial na cultura afro-brasileira, que é a base das escolas de samba:

— Essa atitude agride simbolicamente o passado e a continuidade das escolas.

O escritor destacou que o afastamento dos baluartes, especialmente nas alas de destaque, pode causar uma perda simbólica significativa para as escolas de samba. Embora acredite que em setores fundamentais, como a bateria e os compositores, a presença dos mais velhos se manterá intacta, ele alerta que a exclusão desses membros mais experientes das alas principais vai contra o espírito de culto ancestral, intrínseco às manifestações afro-brasileiras.

— A figura da pessoa mais velha é central dentro da cultura africana e, nas escolas de samba, essa vinculação é ainda mais forte — enfatizou.

A história das escolas de samba é enraizada nas contribuições dessas figuras icônicas, como Jamelão e Cartola, que representaram a essência do samba até idades avançadas. Mussa ressalta que tais baluartes são símbolos vivos das agremiações, transmitindo conhecimento e tradição para as novas gerações.

— Ninguém vai tirar o Martinho da Vila da Vila Isabel, mas essa decisão de limitar a idade agride simbolicamente o passado e a continuidade das escolas — afirmou. — Com o passar do tempo, essa decisão pode levar à perda da ideia de ancestralidade.

Ele espera que outras agremiações não sigam o mesmo caminho, evitando uma desconexão que pode comprometer a identidade cultural das escolas de samba e a continuidade de suas tradições.

Polêmica nas redes

Nas redes sociais, a polêmica envolvendo as limitações de idade nas escolas gerou debate, com alguns defendendo as escolas e argumentando que as críticas são exageradas e mal fundamentadas.

@Vinicius_Nunes7

A Mangueira também divulgou uma nota, afirmando que “não corrobora qualquer forma de preconceito ou discriminação” e que as limitações de idade se aplicam apenas a algumas alas específicas, devido às características das fantasias. A escola reforçou que tem componentes de todas as idades em suas alas e que continuará a ser uma “instituição plural e democrática”.